Depois de um primeiro capítulo eletrizante e da proposta de um pano de
fundo promissor, a abordagem da Ditadura Militar do Brasil entre os anos 1970 e
1980, Os Dias Eram Assim termina na próxima segunda-feira, 18, com a
impressão de que ficou devendo. Didática, insossa e com um número de capítulos
muito maior do que sua trama renderia, a trama das onze (que recebeu a
esquisita nomenclatura de “supersérie”, sendo que não tem nada de “super” e nem
de “série”) chega ao fim sem empolgar.
A ideia inicial das autoras Ângela Chaves e Alessandra Poggi era boa.
Basicamente, Os Dias Eram Assim se apresentou como uma história de amor
convencional, cujos mocinhos viviam as idas e vindas de um amor proibido, tendo
como um dos obstáculos os desdobramentos dos “anos de chumbo” brasileiros.
Assim, Alice (Sophie Charlotte) e Renato (Renato Góes) se apaixonam, mas não
conseguem viver este amor porque ela é filha do poderoso Arnaldo Sampaio
(Antonio Calloni), empresário financiador do regime militar, enquanto ele é
irmão de Gustavo Reis (Gabriel Leone), jovem engajado que se envolve nos
protestos contra a Ditadura e acaba preso e torturado pelo regime. Assim,
Arnaldo acaba se unindo ao ex-noivo de Alice, Vítor (Daniel de Oliveira), para
separar o casalzinho.
Após uma primeira semana de tirar o fôlego, Os Dias Eram Assim
botou o pé no freio no andamento da trama, mas, ainda assim, era interessante.
O pano de fundo funcionava, a ambientação dos anos 1970 era extremamente
bem-feita, e a trilha sonora, embora não fugisse do lugar-comum, ajudava o
espectador a mergulhar no período histórico ainda recente. Nesta fase, a trama
só tinha o empecilho de tramas paralelas soltas e quase sem espaço, como a
história envolvendo Toni (Marcos Palmeira) e Monique (Letícia Spiller) e,
principalmente, os personagens que usavam as artes como protesto político, no
qual se enquadravam Maria (Carla Salles), Leon (Maurício Destri) e Vera (Cássia
Kis). Estes ficaram um tanto apagados em meio aos capítulos curtos nos quais os
conflitos de Alice e Renato predominavam.
A coisa ficou um pouco pior quando a direção da Globo, insatisfeita com
os primeiros resultados da obra, tratou de implantar um plano de ação baseado
na constatação, via grupos de discussão, de que parte da audiência não entendia
o que era a Ditadura Militar. Assim, a personagem Natália (Mariana Lima), uma
professora universitária também perseguida pelo regime, tratou de surgir em
teleaulas explicando o período histórico. Sem nenhuma sutileza, as aulas
ajudaram a diminuir o ritmo de Os Dias Eram Assim, deixando tudo meio
enfadonho.
Ainda assim, a novela (sim, novela!) ainda conseguia manter o
interesse, sobretudo pelos clássicos nuances folhetinescos que acometiam os
protagonistas. Num plano de Arnaldo, Vítor e o delegado Amaral (Marco Ricca),
Renato é forçado a sair do país, se mudando para o Chile. Grávida, Alice é
levada a acreditar que o amado está morto e acaba se casando com Vítor,
enquanto, no Chile, Renato conhece Rimena (Maria Casadevall) e se envolve com a
moça. Os anos se passam e, com a Anistia, Renato retorna ao Brasil. Começam as
idas e vindas na relação entre o médico e Alice, enquanto o pano de fundo
político acaba ficando desinteressante e a trama entra num banho-maria. Ao
chegar aos anos 1980, Os Dias Eram Assim estacionou de vez.
Em suas últimas semanas, a trama fez uso de todos os artifícios
possíveis por meio de Vítor, que, claro, foi ficando cada vez mais insano e
usando várias artimanhas para separar Renato e Alice, sempre acompanhado de sua
mãe Cora (Susana Vieira). As tramas paralelas finalmente ensaiam decolar,
sobretudo com a ousada relação a três envolvendo Toni, Maria e Monique, ou a
descoberta da homossexualidade de Rudá (Konstantinos Sarris), que se envolve
com Leon. Mas nada muito significativo para a história em si. Nesta fase, o
destaque maior foi a boa abordagem da Aids por meio da personagem Nanda (Julia
Dalavia), que se descobre portadora do vírus HIV quando a doença era uma
novidade e os tratamentos eram parcos. Nesta trama, Os Dias Eram Assim
aproveitou para alertar o público de que a Aids ainda não acabou. Boa mensagem.
Entretanto, nesta reta final, ficou claro que Os Dias Eram Assim
não tinha fôlego para tantos capítulos, tamanha a sensação de que nada
realmente significativo acontecia na trama nestas últimas semanas. Na última
semana, para ainda ter o que dizer, a história acabou resgatando o mistério em
torno da morte de Arnaldo, do qual ninguém se lembrava mais. Na cena da morte
do vilão, ficou claro para o público que ele havia sido assassinado, mas como
os personagens não desconfiaram disso, sua morte deixou de ser assunto na
história. Deste modo, a morte nem foi tema de conversa nenhuma nos meses que se
seguiram, fazendo o público se esquecer e pouco se importar com ela. A
revelação de que Ernesto (José de Abreu), que nem estava na história quando
tudo aconteceu, era o assassino, pode ter valido como surpresa. Mas, ao mesmo
tempo, fez de bobo aquele espectador que resolveu bancar o detetive.
Para o último capítulo, então, fica apenas a expectativa sobre os
desfechos dos personagens-chave, como Vítor, Cora e Amaral. Os pombinhos Alice
e Renato, claro, devem ter seu final feliz para sempre, e Os Dias Eram Assim
ainda deve fazer um paralelo entre o cenário político brasileiro passado e
presente. E só. Ou seja, Os Dias Eram Assim não chegou a ser uma trama
ruim, mas saiu de cena devendo ao público um novo Anos Rebeldes. E fica
a lição à Direção de Teledramaturgia da Globo: as novelas das onze (ou “superséries”)
funcionavam melhor com capítulos a menos. Aliás, era esse o grande charme das
boas novelas das onze, como O Astro e Verdades Secretas: poucos
capítulos, muita ação e alguma ousadia. Deveriam considerar isso para as
próximas temporadas.
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André Santana
5 Comentários
Olá, tudo bem? Dis-cor-do!!! Eu gostei da novela Os Dias Eram Assim. Podem falar que é supersérie, mas é novela das onze. Rs..Gostei do texto. Do enredo. E também do elenco no geral (menos do Renato Goes...). Comentarei no meu blog. Balanço com os pontos positivos e negativos. Aguardem! Abs, Fabio www.tvfabio.zip.net
ResponderExcluirHehehe, eu achei bem mais ou menos. Esperava mais. Abraço!
ExcluirOi Andre. Tudo bom ? Posso tirar duas duvidas ? Voce eh a favor ou contra de uma novela ser uma obra aberta ? E eh a favor ou contra os grupos de discussao ?
ResponderExcluirAbraco
Sou a favor de obra aberta e de grupos de discussão. Só acho que os resultados dos grupos de discussão devem ser muito bem analisados. Por exemplo, a Globo justificou a audiência fraca do início de Os Dias Eram Assim alegando que o público não entendia o contexto e não sabia o que era a Ditadura. Mas no grupo de discussão de Novo Mundo, mesmo a novela indo bem, a emissora detectou que muitos confundiam o início do Brasil Império com a Descoberta do Brasil. Ou seja, nos dois casos, houve ignorância do público acerca dos temas abordados, mas se compararmos os dois grupos, ficou claro que o que prejudicou Os Dias não era a falta de conhecimento do público, e sim a falta de uma boa história, pois, em Novo Mundo, mesmo não entendendo o contexto histórico, o público embarcou. Considero então que a emissora errou ao analisar os resultados do grupo de discussão em Os Dias. Mas sim, é uma ferramenta importante.
ExcluirOi Andre. Tudo bom ? Posso tirar duas duvidas ? Voce eh a favor ou contra de uma novela ser uma obra aberta ? E eh a favor ou contra os grupos de discussao ?
ResponderExcluirAbraco