"Essa novela é nossa, meu rei!" |
Ao estrear no horário nobre da Globo, João Emanuel Carneiro
acumulou tramas nas quais imprimiu uma identidade muito própria. Adepto do
folhetim tradicional, com muitas reviravoltas e ganchos poderosos, o autor
também incluiu em suas tramas elementos que subvertiam o tradicional em alguns
momentos, sobretudo na aposta em personagens dúbios que, em algum momento,
mudam de rota e surpreendem. Por conta disso, atraiu uma legião de fãs fiéis,
que esperam sempre surpresas oriundas da imaginação fértil do jovem autor.
Isso começou em A
Favorita, quando João Emanuel Carneiro esperou 60 capítulos para contar ao
público quem era a mocinha e quem era a vilã da história. O autor jogou com seu
público, apresentando Flora (Patrícia Pillar) como uma mãe em busca de justiça,
e Donatela (Claudia Raia) como uma rica esnobe e deslumbrada. Mais adiante,
revelou a verdade: Flora estava fingindo e Donatela era uma grande vítima de
toda a situação. A partir daí, A Favorita
virou um novelão tradicional, mas este jogo com a audiência na primeira fase da
obra não deixa de ser uma ousadia.
A Favorita abriu caminho para Avenida Brasil, principal sucesso do
autor. Desta vez, João Emanuel Carneiro deixou bem claro quem era a mocinha e
quem era a vilã. Mas apostou em nova subversão, ao inverter características
mais comuns ao folhetim tradicional. Normalmente, uma mocinha é enganada pela
vilã até o fim da obra, quando decide tomar uma atitude. Em Avenida Brasil, era a mocinha Nina
(Débora Falabella) quem tinha o controle da situação. Até a metade da obra, era
ela quem enganava a vilã Carminha (Adriana Esteves), conquistando sua confiança
para armar o bote mais adiante.
Aí veio A Regra do
Jogo, quando Carneiro optou por dar um passo além. Ao invés de apostar numa
rivalidade entre duas mulheres, o autor trouxe a trama de um homem, Romero
Rômulo (Alexandre Nero), numa saga no qual ele pendia para o bem e o mal ao
longo de toda a trajetória. Bandido, Romero mantinha uma imagem pública ilibada
e, num determinado momento, acaba se apaixonando pelo mito que criou para si e
tenta torná-lo real. Entretanto, sua incursão no mundo do crime o coloca sempre
em xeque, e Romero não consegue se livrar da vida bandida. Como se vê, uma trama
mais complexa, o que fez de A Regra do
Jogo a novela menos querida do portfólio do autor.
Talvez por conta do relativo fracasso de A Regra do Jogo, João Emanuel Carneiro
resolveu partir para uma nova estratégia na atual Segundo Sol. O autor apostou numa história de amor clássica, ao
narrar a saga de Luzia (Giovanna Antonelli), a mocinha que teve a família
destruída pela dupla de vilãs Karola (Deborah Secco) e Laureta (Adriana
Esteves) ao se apaixonar por Beto Falcão (Emílio Dantas), um cantor que fingiu
a própria morte e se viu tornar um ídolo falecido. No entanto, Carneiro não
deixou algumas das características de sua obra de fora do novo enredo, mas as
deslocou para suas tramas paralelas. Assim, pela primeira vez em sua passagem
pela faixa das nove, Carneiro construiu uma novela cujas tramas paralelas são
mais interessantes que a principal.
Dois personagens de Segundo
Sol carregam a dubiedade que tanto atrai Carneiro. Uma delas é Rosa
(Letícia Colin), considerada a “protagonista moral” de Segundo Sol, e que enfrentou as vilãs e se colocou no centro de
praticamente todos os acontecimentos. E, embora apresentada como uma prostituta
que lutava para se livrar das dificuldades causadas por uma família opressora,
Rosa acabou se deslumbrando com o poder que a vida ao lado de Laureta
proporciona. Agora, aconselhada pela vilã-mor, ela dá o golpe da barriga no
desavisado Valentim (Danilo Mesquita).
O outro é Roberval (Fabrício Boliveira), protagonista de uma
história bastante interessante. Roberval e Edgar (Caco Ciocler) são filhos do
poderoso Severo Athayde (Odilon Wagner) com sua empregada, Zefa (Claudia Di
Moura). Mas Severo escolheu o filho branco para ser criado como legítimo,
enquanto o filho negro foi criado na casa unicamente como o filho da empregada
que se torna motorista. Ao descobrir a verdade, Roberval se revolta, tomando
atitudes um tanto controversas contra os Athayde. Nesta saga, ele oscila: às
vezes parece se compadecer, mas logo é tomado pelo ódio. Trata-se do entrecho
mais original e cheio de nuances de Segundo
Sol.
Enquanto isso, Luzia e Beto tornaram-se coadjuvantes de
luxo. Passaram vários capítulos sem qualquer sequência importante, Voltaram ao
centro do enredo apenas esta semana, quando Luzia foi inocentada da acusação de
ter matado o ex-marido, ao mesmo tempo em que Beto finalmente revela a todos
que está vivo.
Ou seja, na prática, João Emanuel Carneiro construiu uma
narrativa no qual colocou o casal principal como um romance açucarado para
agradar o espectador do folhetim tradicional. Eles são o par romântico central,
mas não necessariamente movem a história. O eixo motor da trama foi deslocado
para núcleos paralelos. Todos muito bem amarrados, o que mostra outra novidade
do estilo do autor, anteriormente adepto de tramas desconectadas do eixo
principal. A estratégia em si não é uma novidade. Gilberto Braga fez isso em Insensato Coração e Babilônia, tramas cujo casal romântico central em nada acrescentava
ao enredo. Silvio de Abreu também fez isso em Passione, e até Aguinaldo Silva usou da estrutura em Império.
A Favorita, Avenida
Brasil e A Regra do Jogo tinham tramas centrais
fortes e interessantes, e núcleos paralelos desinteressantes e desnecessários.
Já em Segundo Sol, acontece o
inverso. Provavelmente, Carneiro mudou sua estrutura anterior para tentar fazer
uma história a prova de erros, capaz de agregar públicos distintos. Com isso,
não criou uma nova Avenida Brasil,
mas também conseguiu escapar de assinar uma nova A Regra do Jogo.
André Santana
4 Comentários
Olá, tudo bem? Segundo Sol está bem longe de ser uma das minhas novelas preferidas..... Nesta semana, a trama cresceu, mas há sérios problemas que comentarei no meu blog em breve. Abs, Fabio www.blogfabiotv.blogspot.com.br
ResponderExcluirOi Fabio! Também não é minha preferida, não, mas, no geral, gosto da novela. Mas concordo contigo, ela tem alguns problemas estruturais. Parece que entrou no ar sem estar totalmente madura para isso. Abraço!
ExcluirOi Andre. Lembro que sua ultima novela das nove foi AvBr. Voce poderia fazer o seu ranking das novelas do JEC? A minha eh assim: 1 A Favorita. 2 A Regra do Jogo 3 A Cor do Pecado 4 Cobras e Lagartos 5 AvBr 6 Segundo Sol.
ResponderExcluirMas nao eh porque Segundo Sol esta em ultimo que isso significa que ela seja ruim, pelo contrario, eh boa. Nao existe novela ruim do JEC, por enquanto. Apenas mais fraca. E como voce mesmo disse, as tramas paralelas sao mais interessantes que a do casal Beto Luzia. Eu gosto mais a historia dos Athayde, que eh o JEC de Regra do Jogo.
Oi Daniel! Do Carneiro, minha preferida é A Favorita. Depois vem Avenida Brasil, Da Cor do Pecado, A Regra do Jogo, Segundo Sol e Cobras & Lagartos. Abraço!
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