A Vida da Gente é uma das novelas preferidas do TELE-VISÃO. A “edição especial” da novela na Globo serviu para reafirmar as qualidades da trama de Lícia Manzo, uma mestra na construção de conflitos psicológicos e familiares. Confira abaixo a última análise publicada pelo blog na época de sua exibição original, num texto postado em 3 de março de 2012:
A novela A Vida da Gente chegou ao fim com todos os méritos. Como já foi dito aqui anteriormente, a trama não foi um megassucesso de audiência, mas teve o grande trunfo de arrebatar de vez o público que, desde o início, comprou a história do triângulo amoroso entre Ana (Fernanda Vasconcellos), Manu (Marjorie Estiano) e Rodrigo (Rafael Cardoso). Há muito tempo não se via um triângulo amoroso tão intrincado, tão complicado, apesar da aparência simples do enredo da obra.
Simples porque a autora estreante Lícia Manzo optou pelo caminho do naturalismo. Sua trama corre como a vida, com paradas, contemplações, percalços, discussões e surpresas. Ao contrário da atual trama das nove [Fina Estampa], um pastelão calcado na ação entre mocinhos e bandidos, A Vida da Gente não teve vilões. Seus conflitos são mais próximos, mais reconhecíveis, mais palatáveis e, por isso mesmo, extremamente envolventes.
Comparada a Manoel Carlos, por usar do mesmo estilo de narrar o cotidiano, Lícia Manzo provou, com o delicioso texto de A Vida da Gente, que tem uma assinatura própria e não precisa ser comparada a ninguém. Pois, enquanto a crônica de Manoel Carlos se torna, por vezes, enfadonha de tão “cotidianesca”, a de Lícia Manzo arrebata por traduzir conflitos psicológicos de maneira quase poética.
Quem acompanhou os capítulos desta saga, com certeza reparou na qualidade dos diálogos. E não tinha como ser diferente, afinal, A Vida da Gente é, antes de tudo, um dramalhão de conflitos psicológicos e, para traduzi-los à linguagem de folhetim, devia mesmo recorrer aos diálogos. Por isso mesmo, todos os personagens da novela tinham, ao menos, um confidente.
E a trama principal, aparentemente simples, mostrou-se, na verdade, bastante complexa. A história de duas irmãs que disputam um homem é mote mais do que batido em novelas, mas A Vida da Gente o fez de uma maneira ímpar. Ao nos apresentar Ana, Manu e Rodrigo como personagens de carne e osso, com defeitos e virtudes, a novela soube dividir a torcida do público. Ana, Manu e Rodrigo foram todos vítimas de uma situação que não criaram, mas foram empurrados a ela. Assim, não existem culpados ou inocentes. Ana dormiu por cinco anos e sua vida seguiu sem ela. Nada mais natural que as situações se reconfigurem a partir de uma ausência.
A Vida da Gente soube também discutir as novas configurações familiares, retratando famílias compostas não somente por pais, mães e filhos, mas também padrastos, enteados e meios-irmãos. Além disso, foi caracterizada por personagens femininas fortes, em detrimento a uma galeria de homens passivos, o que indica uma mudança de comportamento social.
O texto refinado, portanto, foi o grande mérito de A Vida da Gente. Mas ele foi amplamente valorizado pela direção, encabeçada por Jayme Monjardim. O estilo do diretor casou em cheio com a trama psicológica, com fotografia impecável e a contemplação necessária para reproduzir este drama. Além disso, a novela contou com interpretações vitoriosas: Fernanda Vasconcellos finalmente emplacou uma boa mocinha; Marjorie Estiano mostra-se melhor a cada trabalho; e Rafael Cardoso foi um mocinho competente.
Destaque ainda para a sempre ótima Nicette Bruno (Iná); Ana Beatriz Nogueira (Eva); Mallu Galli (Dora); Leona Cavalli (Celina); Regiane Alves (Cris); Gisele Fróes (Vitória); Claudia Mello (Moema); e Luiz Serra (seu Wilson). Sem esquecer, claro, da maravilhosa Maria Eduarda, a Nanda, que finalmente ganhou um personagem à altura de seu talento.
A Vida da Gente, assim, termina com aquela sensação de que nem passou. No entanto, todos os personagens passaram por transformações profundas ao longo de suas trajetórias. Ou vai dizer que a vida da gente não é assim?
Publicado em 03 de março de 2012
Entre 2011 e 2012, o TELE-VISÃO publicou várias análises sobre o andamento da obra. Provavelmente, foi a novela que mais rendeu textos na história deste humilde blog. Infelizmente, por conta do fim do UOL Blog, os arquivos do TELE-VISÃO deste período não estão mais disponíveis na internet. Mas os principais textos do período foram reunidos num livro, o “Tele-Visão: A Televisão Brasileira em 10 Anos”, que você pode comprar AQUI ou AQUI. Há também a versão para Kindle, que você compra AQUI.
André Santana
07/08/2021
3 Comentários
Olá, tudo bem? Tive tempo ainda de resgatar todos os meus textos do blog ainda no UOL. Com as reprises, temos a oportunidade de republicá-los no novo espaço. Já divulguei o balanço final com os pontos positivos e negativos da obra. Abs, Fabio www.blogfabiotv.blogspot.com.br
ResponderExcluirProcurei o seu perfil nas redes sociais e não encontrei. Não teremos o Troféu Santa Clara? Abs, Fabio
ResponderExcluirnovela sonífero, feita pra dormir enquanto deixa a tv ligada
ResponderExcluir