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"Todas as Flores" foi uma ótima experiência, mas hiato atrapalhou

Regina Casé e Sophie Charlotte em Todas as Flores
Regina Casé e Sophie Charlotte em Todas as Flores (divulgação/Globo)

A Globo encerrou essa semana Todas as Flores, primeira novela 100% original do Globoplay. A trama teve o mérito de devolver o brilho à carreira de João Emanuel Carneiro, que andava em baixa por conta dos insucessos A Regra do Jogo (2015) e Segundo Sol (2018). 

O autor voltou à velha forma ao conseguir reunir algumas de suas principais características: tramas envolventes, com personagens carismáticos e dúbios, reviravoltas rocambolescas e muita emoção. Características essas que fizeram o sucesso de suas principais obras, A Favorita (2008) e Avenida Brasil (2012).

Todas as Flores foi feliz, sobretudo, na construção de suas vilãs. Zoé (Regina Casé) foi uma malvada adoravelmente carismática: debochada, despachada, divertida e cheia de contradições. Foi uma personagem deliciosa, que apresentou ao público uma nova faceta de Regina Casé. A experiência de vê-la numa personagem diferente ficou ainda mais saborosa se lembrarmos que ela veio de dona Lurdes, o arquétipo da mãe em Amor de Mãe (2019). Zoé, na comparação, era a antítese do tipo anterior. Fora que a novela se aproveitou bem desta situação, fazendo Zoé dizer frases como “de amor de mãe eu entendo”.

Vanessa (Letícia Colin) foi igualmente instigante. Ao contrário de Zoé, que tinha traços de humanidade, Vanessa era uma malvada das mais caricatas, que encontrou em Letícia Colin um tom perfeito. A atriz claramente se divertiu em cena ao disparar as maiores barbaridades que um ser humano poderia dizer em voz alta.

A relação das duas com Maíra (Sophie Charlotte) foi o ponto alto de Todas as Flores. Ao longo de toda a trama, as protagonistas trocaram de lado, estabeleceram novas relações e construíram uma dinâmica que se transformou num jogo. Além disso, o autor foi muito feliz ao apresentar uma mocinha deficiente visual sem descambar para o capacitismo. 

No entanto, apesar das qualidades, Todas as Flores foi bastante criticada pelo público e por boa parte da crítica especializada, sobretudo em sua reta final. O discurso mais repetido foi que a novela não conseguiu manter o nível de sua boa primeira fase, marcada por momentos de pura emoção. Será?

Na verdade, o maior problema de Todas as Flores foi o hiato que a Globo planejou em sua exibição no Globoplay. Para fortalecer o BBB23, a emissora optou por dividir a novela em duas partes, o que se mostrou uma estratégia equivocada. Afinal, a interrupção acabou desestimulando parte do público de seguir acompanhando a obra. Tanto que a repercussão da segunda fase foi bem menor.

Porém, a pior consequência do hiato foi a criação de expectativas que se revelaram frustradas. Permita-me ser a voz discordante de boa parte das críticas, mas a segunda parte de Todas as Flores não foi muito diferente da primeira. Desde o início, João Emanuel Carneiro propôs uma espécie de fábula moderna, ousada, mas absolutamente rocambolesca, como um clássico folhetim. As situações absurdas estavam ali desde o começo.

Elas pareceram mais absurdas na fase final porque o hiato fez com que parte do público criasse expectativas demais. E, como se sabe, quanto maior a expectativa, maior um possível tombo. Aliás, isso aconteceu também com Manuela Dias em Amor de Mãe, novela interrompida pela Covid-19. Muita gente reclamou que a trama não voltou com a mesma qualidade, um erro. A novela só ficou mais corrida, já que a autora tinha poucos capítulos para fechar a história. Mas a trama em si se manteve no mesmo patamar. 

Uma das reclamações foi que não fez sentido Zoé ter inocentado Maíra no julgamento e assumido todas as suas culpas. Mas, na verdade, a novela toda caminhou para isso. A vilã sempre repetiu que nunca havia conhecido uma pessoa tão boa quanto Maíra, além de ter se mostrado verdadeiramente envolvida pela filha em diversas situações. Também teve quem reclamou que Rafael (Humberto Carrão) e Diego (Nicolas Prattes) acabaram com a fazenda da quadrilha de tráfico humano “fácil demais”. No entanto, toda a trama envolvendo a organização já era bastante rocambolesca. O autor nunca teve grandes compromissos com a realidade.

Mas, claro, não existe novela perfeita e Todas as Flores teve suas derrapadas na reta final. A vingança de Maíra, por exemplo, não fez o menor sentido. A ideia da mocinha de comprar crianças para se aproximar de Galo (Jackson Antunes) foi bem estapafúrdia. Além disso, Mauritânia (Thalita Carauta) ter perdido a vitalidade do início também foi imperdoável. A melhor personagem da novela se apagou na reta final…

O desenvolvimento de Judite (Mariana Sousa Nunes) também deixou a desejar. A personagem tinha uma boa história de amor mal resolvida com Humberto (Fabio Assunção), e a relação deles era interessante. Afinal, Humberto era um bandido que ficava no limiar entre o bem e o mal. E Judite era sua conexão com o “lado do bem”, já que ela representava uma vida simples e feliz que ele acabou perdendo ao enveredar para o crime. 

Ao que tudo indica, o autor não teve tempo de desenvolver melhor este conflito e explorar de uma maneira mais envolvente a dubiedade de Humberto. Com isso, a mãe de Pablo (Caio Castro) só aparecia para ditar regras, repetindo sempre a mesma ladainha - a frase “tem dedo da Zoé nisso” até virou meme. Em suma, Judite era uma personagem de grande potencial, mas que não chegou lá. Aliás, Mariana Nunes segurou bem as pontas, ótima atriz que merece mais personagens de destaque.

No geral, Todas as Flores foi uma boa novela. Foi um novelão clássico, com uma dose de ousadia e uma agilidade interessante, proporcionada pela menor duração e pelo fato de ser uma obra para o streaming. Foi uma boa experiência, que poderia ter sido muito melhor se não tivesse sido dividida ao meio.

André Santana

03/06/2023

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3 Comentários

  1. Olá, tudo bem? Na realidade, a TV Globo deveria ter seguido o planejamento original com Todas as Flores sendo a substituta de Pantanal. Abs, Fabio www.blogfabiotv.blogspot.com.br

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  2. Achei Todas as Flores decepcionante. Tramas paralelas inúteis, mudanças abruptas de personalidade dos personagens, com alguns ficando burros aleatoriamente, fora os erros de roteiro e da direção. Enfim, o João Emanuel Carneiro ficou em 2012 e não evoluiu de lá para cá.

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  3. Como não tenho acesso ao Globo Play só assistirei Todas as Flores quando passar na Globo TV Aberta! A Regra do Jogo (2015/2016) começou fiasco (chegou inclusive a perder audiência para a novela bíblica Os Dez Mandamentos da Record de setembro à novembro de 2015) mas terminou sucesso, já Segundo Sol (2018) foi uma novela ruimzinha porém não foi nem aquele sucesso e nem aquele fracasso.

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