A autora Maria Adelaide Amaral (reprodução) |
Em 2001, Maria Adelaide Amaral já era famosa por suas minisséries, como A Muralha (2000) e Os Maias (2001). A autora, que também foi colaboradora em novelas de Cassiano Gabus Mendes e Silvio de Abreu, tinha apenas uma novela no currículo, o remake de Anjo Mau (1997), e se preparava para assinar seu primeiro folhetim original.
A princípio, a trama se chamaria Um Lugar ao Sol - título que acabou batizando a novela de Lícia Manzo de 2021 - e teria Fábio Assunção, Adriana Esteves e Julia Feldens nos papéis centrais. Assunção era o mocinho, um estudante de Economia que trabalhava como agente turístico e ajudava moradores de comunidades carentes de São Paulo a desenvolver negócios.
“O tema da trama poderia ser reduzido a uma única frase: a felicidade não se compra. É isso que Daniel [Fábio] defenderá. Sua ascensão social se dará por vias legítimas, ou seja, à custa de seu talento, inteligência e esforço. Laura [Adriana Esteves], por sua vez, considera normais todos os meios para atingir seu objetivo, que no caso é ter luxo, conforto e segurança. Daniel é apaixonado por Laura e vice-versa. No meio dos dois encontra-se Beatriz [Julia Feldens], uma jovem milionária. Mas nem o dinheiro nem a posição social fizeram com que ela se sentisse mais autoconfiante ou mais amada. Ela é apaixonada por Daniel”, explicou a autora ao jornal O Globo, em 5 de agosto de 2001.
Daniel era filho bastardo de um político corrupto que herda uma fortuna do pai. Ele, então, decide aplicar o dinheiro nos projetos sociais que ajuda.
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A todo vapor
Fábio Assunção e Adriana Esteves (reprodução) |
Ambientada na cidade de São Paulo, Um Lugar ao Sol teria Denise Saraceni como diretora geral e de núcleo. A trama também marcaria a estreia de João Emanuel Carneiro em novelas, como colaborador. A autora Maria Adelaide Amaral e a diretora já trabalhavam a todo vapor na escalação de elenco e nos primeiros capítulos da novela, prevista para substituir A Padroeira em janeiro de 2002, na faixa das 18h.
Além da trinca principal, outros atores já estavam escalados, como Mauro Mendonça, Vera Holtz e Lilia Cabral. Amaral revelou ainda que escreveu uma personagem, Gilda, pensando em Irene Ravache. Paulo Vilhena, jovem galã em ascensão na Globo por conta do sucesso no seriado Sandy e Jr, também estava escalado.
“Otavinho [Paulo] é um garoto que já nasceu usando gravata e querendo estudar em Harvard. É um mauricinho conservador, desses que sabem tudo sobre finanças do Primeiro Mundo e se comportam como se estivessem vivendo e trabalhando em Nova York”, explicou a autora ao O Globo em 26 de agosto de 2001.
Pouco tempo depois, o título Um Lugar ao Sol foi descartado e definiu-se o nome definitivo, A Dança da Vida. Tudo parecia encaminhado, até que a Globo começou a ter problemas com o Ministério da Justiça para liberar a trama para a faixa das 18h. Na época, a classificação indicativa dos programas estava vinculada aos horários de exibição, e A Dança da Vida foi considerada imprópria para ser exibida antes das 21h.
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Mudanças e cancelamento
A atriz Julia Feldens faria sua primeira protagonista em A Dança da Vida (reprodução) |
Como A Dança da Vida não foi inicialmente liberada para a faixa das 18h, o diretor Mario Lucio Vaz, então responsável pelo artístico da Globo, solicitou alterações à Maria Adelaide Amaral. A ideia era deixar a trama mais leve e, para isso, foi pedido à autora que removesse uma prostituta, um traficante e um garoto drogado da história, de acordo com a Folha de S. Paulo de 19 de outubro de 2001.
"Acharam a minha novela meio ‘forte’ para o horário das 18h. Algumas coisas incomodavam e foram retiradas, mas a corrupção política e a discussão ética são inegociáveis. Sem isso não há novela. Vamos aguardar o próximo round", disse Maria Adelaide ao jornal.
Mas não demorou muito para que A Dança da Vida acabasse na gaveta. Em 25 de outubro de 2001, a Folha de S. Paulo informou que a Globo havia adiado a novela, considerando que seria inviável desenvolver uma trama política num ano eleitoral.
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Substituta
Como faltavam menos de três meses para o lançamento de A Dança da Vida, a direção da Globo precisou correr contra o tempo para definir o que colocar no lugar. A emissora avaliou outras sinopses e optou por produzir Coração de Estudante (2002), de Emanoel Jacobina. Para dar tempo de implantar a nova novela, A Padroeira foi esticada em um mês.
Parte do elenco escalado para A Dança da Vida foi remanejado para Coração de Estudante, casos de Fábio Assunção, Adriana Esteves, Paulo Vilhena e Julia Feldens. A novela estreou em fevereiro de 2002 e, a princípio, não conquistou o público. Mas a trama melhorou quando o veterano Carlos Lombardi foi escalado para atuar como supervisor.
Enquanto isso, A Dança da Vida, que a princípio teria sido adiada, foi esquecida de vez. Maria Adelaide Amaral voltou a escrever minisséries e emplacou sucessos como A Casa das Sete Mulheres (2003), Um Só Coração (2004) e JK (2006). Ela só voltaria às novelas em 2010, com Ti Ti Ti.
Curiosamente, outra novela da autora também foi adiada por causa de política. A Lei do Amor (2016) estava prevista para substituir A Regra do Jogo (2015) às 21h, mas a Globo adiou com a desculpa de a novela falar de política, o que seria complicado em ano eleitoral.
Na verdade, o canal queria testar uma trama rural no horário ao identificar o cansaço do público com novelas urbanas e escalou Velho Chico (2016), adiando A Lei do Amor. Com isso, ficou claro que a questão da política era mera desculpa da Globo, já que a novela de Benedito Ruy Barbosa também tinha uma trama política. A Lei do Amor estreou na sequência e foi um dos maiores fiascos da faixa das 21h da Globo - e a tal da trama política mal se desenvolveu, diga-se.
André Santana
03/09/2024
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