Volta ao passado pode ser o caminho para Globo acertar sua teledramaturgia

Susana Vieira, Carolina Dieckmann e Renata Sorrah em Senhora do Destino (divulgação)

A notícia da semana no universo televisivo é a volta de Aguinaldo Silva à Globo. O veterano autor, criador de alguns dos maiores sucessos da teledramaturgia da emissora, como Senhora do Destino (2004), assinou novo acordo com o canal para desenvolver Três Graças, novela que pode substituir Vale Tudo no ano que vem. Esta última, por sua vez, virá na sequência de Mania de Você.

Aguinaldo Silva foi um dos primeiros grandes nomes da Globo a perder seu contrato de exclusividade, em 2020. O fim do vínculo se deu logo após a conclusão de O Sétimo Guardião (2018), um fiasco histórico da faixa das nove da Globo. Na época, atribuiu-se o fracasso da produção à demissão, além de um suposto desentendimento entre o autor e Silvio de Abreu, então diretor de teledramaturgia da emissora. Esta última tese parece pouco provável, já que o próprio Abreu deixou o canal na sequência.

Entre fofocas e rumores - algumas alimentadas até pelo próprio Aguinaldo - fato é que a decisão da emissora tem a ver, principalmente, com o alto salário do autor. É notório que a emissora, na tentativa de enxugar gastos, vem abrindo mão de grandes nomes justamente por conta do contra cheque polpudo destes profissionais. No fim, é o dinheiro quem dita as regras, seja na Globo ou qualquer outra emissora.

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Carreira de sucesso

Mas, se do ponto de vista da economia a dispensa de Aguinaldo Silva se justifica, do ponto de vista artístico a demissão foi um grande erro. Afinal, goste-se ou não da obra do autor, é fato que Silva é um novelista popular, que entende bem o espectador do horário nobre da Globo e tem em seu currículo várias marcas importantes.

Por exemplo: Aguinaldo Silva escreveu, com Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn, a novela Tieta (1989), dona até hoje da maior média de audiência registrada na faixa das oito/nove da Globo: 65 pontos no Ibope! Além disso, ele também foi autor de outras duas das novelas mais vistas dos anos 1980: Roque Santeiro (1985) - escrita com Dias Gomes e que alcançou média de 62,6 pontos - e Vale Tudo (1988) - escrita com Gilberto Braga e Leonor Bassères, com média de 61,2.

Na década de 1990, o autor fez sucesso com Pedra Sobre Pedra (1992), Fera Ferida (1994) e A Indomada (1997), tramas que também anotaram ótimos índices de audiência. Já na década de 2000, Aguinaldo Silva assinou a novela mais vista da década, Senhora do Destino (2004), que anotou média de 50,3 pontos - índice jamais alcançado depois.

Já nos anos 2010, também é de Aguinaldo Silva a novela das nove mais vista da década, Fina Estampa (2011), sucesso que se repetiu na reprise de 2020. Ou seja, há muitos mais êxitos do que fiascos no currículo do autor.

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Crise criativa

Mas é fato também que experiência e currículo recheado de sucessos não garantem o êxito. Gilberto Braga, por exemplo, amargou o fiasco de sua última novela, Babilônia (2015). Manoel Carlos se aposentou após seu maior fracasso, Em Família (2014). Gloria Perez, reconhecida autora popular, derrapou feio com Travessia (2022).

Porém, atualmente, a Globo vive uma evidente crise criativa. Com claras dificuldades em renovar o time de autores do horário nobre, o canal vem se rendendo a remakes. Quando há uma história original, não se alcança grande sucesso. Um Lugar ao Sol (2021) e Travessia foram fiascos, Terra e Paixão (2023) foi morna e Mania de Você, até agora, não disse a que veio.

Neste contexto, resgatar um medalhão com um histórico de sucesso pode servir como oportunidade para que a Globo se reconecte com um público mais tradicional de novelas. Afinal, sabe-se que o público de TV está envelhecendo e, por isso, é importante estreitar laços com a plateia cativa, que pode estar torcendo o nariz para as tramas “modernas”. É um caminho.

André Santana

21/09/2024